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quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Ter ou Não Ter Namorada


Quem não tem namorada é alguém que tirou férias não remuneradas de si mesmo.
Namorada é a mais difícil das conquistas.
Difícil porque namorada de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia. Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão, é fácil.
Mas namorada, mesmo, é muito difícil. Namorada não precisa ser a mais bonita, mas ser aquela a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dela a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção não precisa ser parruda, decidida; ou bandoleira basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição.
Quem não tem namorada é quem não tem amor é quem não sabe o gosto de namorar. Há quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem três pretendentes, duas paqueras, um envolvimento e duas amantes; mesmo assim pode não ter nenhuma namorada.
Não tem namorada quem não sabe o gosto de chuva, cinema sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho.
Não tem namorada quem transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa e quem ama sem alegria.
Não tem namorada quem faz pacto de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos com a felicidade ainda que rápida, escondida, fugidia ou impossível de durar.
Não tem namorada quem não sabe o valor de mãos dadas; de carinho escondido na hora em que passa o filme; de flor catada no muro e entregue de repente; de poesia de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar; de gargalhada quando fala junto ou descobre meia rasgada; de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário.
Não tem namorada quem não gosta de dormir agarrado, de fazer cesta abraçado, fazer compra junto.
Não tem namorada quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de alegria pela lucidez do amor.
Não tem namorada quem não redescobre a criança própria e a da amada e sai com ela para parques, fliperamas, beira - d'água, show do Milton Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos ou musical da Metro.
Não tem namorada quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos; quem gosta sem curtir; quem curte sem aprofundar.
Não tem namorada quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada, ou meio-dia do dia de sol em plena praia cheia de rivais.
Não tem namorada quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir junto com ele.
Não tem namorada quem confunde solidão com ficar sozinho e em paz.
Não
tem namorada quem não fala sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de ser afetivo.
Se você não tem namorada porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos e medos, ponha a calça mais leve, aquela de tergal e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim.
Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo de sua janela. Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteria.
Se você não tem namorada é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido. ENLOU-CRESÇA.

Por Artur da Távola

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